segunda-feira, 28 de maio de 2012

Entrevista: Derlon Almeida

Grafite Genuinamente Nordestino

Por Thiago Pimentel


Com tintas na mochila, a parede indica o grafite
Grafite e xilogravura. O que resultaria na junção de duas manifestações artísticas  distintas e, sobretudo, de épocas diferentes? A partir dessa fusão, o pernambucano de 27 anos Derlon Almeida desenvolveu a atipicidade de sua arte.

Apesar das diferenças, os atributos populares de ambas as modalidades artísticas – xilogravura e street art - harmonizam-se na obra do artista. Obra esta que, representada em grafites peculiares, oferece uma nova opção de realidade a quem passeia pelas ruas de Recife e Olinda, por exemplo.

Tímido, objetivo e, como típico brasileiro, um ávido apreciador de futebol; em uma conversa descontraída,  Derlon deu sua opinião sobre a popularização do grafite e, também, explicou seu estilo e forma de trabalhar enquanto, vez ou outra, desviava seu olhar para uma transmissão esportiva em um televisor distante.  Confira a entrevista abaixo.

Mais Um Grafite No Muro: Desde que você começou a grafitar, o que mudou no pensamento dos grafiteiros?

Derlon Almeida: Os grafiteiros não se importavam com o que a sociedade pensava. O objetivo do grafite era desafiar, chocar. Com o passar do tempo novos artistas surgiram, novas ideias e formas de ocupar as ruas também e isso caiu no gosto do povo. O grafite do Brasil é bem particular e mistura outros campos de arte. Por exemplo, podemos ver nas ruas coisas mais abstratas, diferentes do grafite ‘clássico americano’. Resumindo, seria uma pintura não muito agressiva - em termos visuais. O meu trabalho possui essa característica. Com o passar do tempo, ele acabou caindo no gosto do povo e, mesmo pintando sem autorização algumas vezes, as pessoas esquecem isso e acabam gostando do resultado. Às vezes, me aproveito disso.



MUGNM: E qual seria o objetivo dos grafiteiros recifenses?

DA: Bem, o objetivo comum  da cena local é ocupar as ruas com o que está abandonado, com o que está em desuso. Não pensamos tanto como antigamente, de querer confrontar - apesar que disso estar no sangue do grafiteiro. Mesmo com os artistas antigos, da década de 90, há esse preocupação estética e em pegar uma parede realmente desocupada. O pensamento mudou.


MUGNM:  Dentre os inúmeros grafites do Recife, qual seria a característica mais marcante dos presentes nas ruas da cidade?

DA: O grafite mais colorido. A maioria dos artistas daqui tem uma influência muito grande do movimento hip hop. Essa influência do movimento, mais colorido e vibrante, acaba se refletindo na obra da maioria dos artistas.  
A influência da xilogravura é notória no trabalho do artista


MUGNM:  O que você pensa a respeito da popularização do grafite?

DA: Penso que mesmo o grafite sendo respeitado como forma artística, ele sempre vai ser underground.Pelo ambiente dessa arte ser as ruas, quando ela sai e entra nas galerias o grafite já não é mais grafite. Ness caso, o artista está desenvolvendo outra circuito de arte. Na minha visão, a grafitagem é linguagem de rua; é ação, é atitude e uma linguagem de arte urbana.Ainda existem muitos gratiteiros que não são, necessariamente, artistas plásticos. Defendo o grafite ainda nessa cena underground, mesmo eu estando inserido no “circuito de arte”, tento ir as ruas e manter esse meu lado.Enfim, tento equilibrar os meus lados; não há como fugir.


MUGNM:  De que forma é feita as ditas ‘ocupações’ são realizadas nas ruas?

DA: Bem, depende do artista. Aprendi com minhas influências, principalmente, a forma de ocupar as ruas. Por exemplo, se na parede há um relevo, a partir dele posso fazer um desenho que irá se espalhar; se houver um buraco posso fazer um olho, etc. Há artistas que não criam personagens, criam símbolos. Se sairmos as ruas, poderemos ver muitas formas diferentes de ocupação. É necessário pensar no que quer fazer, pesquisar e raciocionar antes de grafitar.

Traço único que identifica o grafiteiro Derlon

MUGNM:  Aproveitando, como seria seu o seu processo de criação/ocupação?

DA: Particulamente, não tenho nenhum. Odeio fazer esboço e de acordo com o que a parede se apresenta, penso, na hora, o que fazer. Também objetivo pintar rapidamente porque quando saio as ruas, normalmente, não penso em fazer só um grafite. Apenas quando saio acompanhado e tenho preocupação em criar um trabalho em conjunto, penso em uma espécie de diálogo entre as obras na parede. Outros artistas já criam, previamente, o desenho, daí adequam seu rascunho a parede. Normalmente, prefiro sair aos domingos – a cidade está mais tranquila.



MUGNM:  Em termos da ocupação, como é a relação de um grafiteiro com o outro? Há alguma rixa?

DA: Normalmente não temos problema. Alguns preferem sair individualmente, mas claro que existem grupos de amigos que vão às ruas. Sempre nos cumprimentamos. Quando existem problemas, é mais em casos de falta de respeito como, por exemplo, pintar por cima da obra de outra pessoa. Fica chato, não combina. Existe uma certa regra nas ruas, sobre a forma de ocupar o espaço. Tem uns que fazem isso, principalmente os mais novos, mas tentamos conversar para que não se repita. Mas, normalmente, não temos nenhum problema.

Pássaros e assinatura de Derlon em detalhe

MUGNM:  Qual a sua opinião a respeito da cena do grafite no Recife?

DA: Ela está numa balança: em momentos está bom, em outros ruim. Agora a cidade está com muitos artistas, mas depois tende a dar uma esfriada. Uma época muito boa foi o ínicio dos anos 2000. Nesa época o Recife respirou grafite, inclusive vieram muitos artistas do exterior, por coincidência, pra Recife. Artistas com muito prestígio intenacionalmente e nacionalmente que, pintando nas ruas e dialogando, acabaram influenciando a cena local nesse período. Muitos grafiteiros surgiram por influência do que aconteceu nessa época, até então era mais comum ver os grafites em revistas. Acredito que em 2005 houve um declínio, inclusive esta foi a época que eu mais pintei! Hoje a cena está voltando a criar força, apesar de não termos mais tanto contato com artistas de fora, mutia gente anda produzindo e há muitos eventos de grafite, como o Refifusion. Vou as ruas e vejo o Recife mais colorido, o pessoal anda pintando mais.

MUGNM:  Você acredita que os movimentos sociais facilitem o surgimento de novos artistas? No que diz respeito a esses projetos, o que você pensa?

DA: Acredito que a pessoa aprende mais nas ruas - ‘ao lado’ dos artistas - do que dessa forma mais pedagógica. Participei de oficinas de grafite, mas percebi que a base do meu aprendizado foi nas ruas - sempre observando e convivendo com outros artistas. No meu trabalho, não possuo esse lado ‘social’. Trabalho com oficinas, mas em outros campos da arte como a xilogravura, produção de 'cartazes lambe-lambe' e outras manifestações artísticas, por exemplo. Apesar de já ter oferecido oficina de grafite, acredito que o indivíduo desenvolva mais esse tipo de arte nas ruas do que aprendendo técnicas em oficinas. Acho que você tem que respirar, sentir o ambiente; não ficar dentro de uma sala,tem que tentar ir as ruas. Grafite é aprender a tentar ocupar as duas de alguma forma, por isso não sou muito fã desse lado mais pedagógico.

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